sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Review Narcos 1x02 The Sword of Simon Bolivar: Uma guerra é feita de alianças.




Uma guerra é feita de alianças.
Um dos maiores trunfos de se trabalhar com a ficção histórica é o de conseguir se utilizar do conhecimento do espectador a respeito do desenrolar do enredo como ferramenta de ironia dramática, atraindo o público não através do suspense e de perguntas sobre qual serão os próximos acontecimentos, mas de questionamentos sobre como estes se darão . Não sendo à toa que esse expediente é utilizado durante “The Sword of Simón Bolivar”, ao explorar a dinâmica entre o tráfico e os grupos guerrilheiros de extrema esquerda, cujas conclusões podem ser perceptíveis em qualquer sessão Internacional dos jornais mundiais.

A trama central se foca no conflito entre os Escobar e o grupo guerrilheiro Movimento 19 de Abril (M-19) que, para conseguir recursos para custear suas operações, resolve sequestrar um familiar dos irmãos Ochoa, unificando o tráfico no cartel “Morte aos Sequestradores”, liderado por ninguém menos que o protagonista. Ao passo que o Agente Murphy tem a sua chegada em Medellin e seu parceiro Javier Peña (interpretado pelo sempre ótimo Pedro Pascal) se utiliza dos seus contatos do submundo do tráfico para obter detalhes da reunião que tem como objetivo a formação do cartel.
Com um episódio inicial focado primordialmente na figura de Escobar, era esperado que a sequência demonstrasse a interação entre Murphy e Peña, utilizando-se de recursos narrativos como o do tira bom e tira mal para estabelecer a dinâmica entre ambos e ressaltar que suas diferenças de postura estão muito mais ligadas com o contexto de que ambos vieram. Ao passo que Murphy procura atuar de acordo com a legalidade em virtude das premissas americanas de “lei e ordem”, Peña sabe que na Colômbia as instituições são mais frágeis e que, para conseguir duelar de igual com o poderoso narcotráfico, deverá se utilizar de outros artifícios. Contraste este também perceptível pela caracterização de Boyd Holbrook ao tentar trazer uma seriedade constante ao seu personagem enquanto exerce a função de policial, enquanto Pedro Pascal possui uma mistura de irreverência e melancolia em seu olhar e postura que ressaltam a desesperança que permeia a sua caracterização.

Entretanto, “The Sword of Simón Bolivar” peca ao não saber dosar: a narração em off. Artifício característica do roteirista já explorado com frequência por José Padilha em Tropa de Elite para trazer um caráter quase documental ao projeto e que, se no piloto serviu sua função de situar o espectador no tempo e local do universo diegético da série, aqui parece subestimar a inteligência do público em conseguir  estabelecer a conexão entre fatos simples (como no momento em que precisa explicar todas as motivações do M-19 ao escolher sequestrar um membro da família Ochoa). Ao optar por se ter esta característica em seu projeto, Padilha deve entender que ela possui sua eficácia ao servir como um complemento ao que já consegue ser demonstrado através da câmera, como na sequência em que contextualizam o que era o M-19 e o seu modo de atuação para os estabelecerem como inimigos que, no mínimo, mereceriam respeito por parte do protagonista.
Se a narrativa peca por seus excessos, Narcos atinge o seu máximo quando percebe estar inserido na arte do audiovisual, como pode ser percebido na sequência inicial em que os montadores Victor Du Bois e Leon Trombetta intercalam a família Murphy sobrevoando a América Latina com o crescimento das operações do narcotráfico. Para não falarmos do design de produção que, concebido por Anthony Medina e Diana Trujillo, se usa apropriadamente dos cenários para apoiarem o que está sendo exposto em cena, como pode ser visto na diferença entre os apartamentos de Murphy (trazendo a ideia de lar perfeito americano em pleno solo colombiano) e Peña (pequeno e bagunçado, fazendo jus à personalidade solitária do personagem, sendo uma pena que este belo cenário precise ser dissecados em diálogos expositivos como o clássico “você precisa de uma esposa”).
A prova da qualidade do projeto é eu conseguir chegar até aqui sem falar na caracterização de Wagner Moura que, por mais interessante que seja, não se sustentaria caso fosse o único atrativo da narrativa. Trazendo trejeitos que alternam entre a calma que ressalta sua personalidade calculista e picos de euforia que demonstram a predileção à violência de seu Pablo Escobar, Moura traz complexidade ao seu personagem (em que, ao mesmo tempo que pratica atos crueis, parece genuinamente acreditar estar fazendo tudo isto por um causa maior) e faz com que o espectador consiga perceber que, por mais violentos ou astutos seus opositores sejam, o protagonista consegue estar sempre um passo à frente destes (não sendo uma surpresa, portanto, que tão logo Murphy pouse na Colômbia, já esteja na mira do narcotráfico). E se pode ser extraído um ponto negativo do ator é unicamente a sua perceptível dificuldade no Espanhol, trazendo diálogos com uma falta de fluidez na velocidade que logo demonstram não serem proferidos por um nativo.
O que nos traz à cena que sela a parceira entre Escobar e o M-19, que moldará não apenas o narcotráfico como o próprio movimento de guerrilha colombiano. Se, ao trazer um conflito entre o grupos Morte aos Sequestradores e  M-19, Padilha já o espectador astuto saiba qual será o desfecho, a utilização do artefato que faz jus ao título para unir ambos os lados da trama e simbolizar o poder que os guerrilheiros acreditavam possuir e demonstra o porquê de Escobar possuir um nome quase mítico. Se a Espada de Simón Bolivar foi retirada do museu para retornar à guerra, não será para uma guerra de libertação do país, e sim para um conflito muito mais complexo quanto à sua moralidade: A Guerra contra as Drogas.
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